Aprovada em 27 de março de 2024, a Lei 14.833 tem por objetivo conceder ao réu a oportunidade de cumprir a tutela específica em caso de requerimento de sua conversão em perdas e danos. Com a edição dessa lei, foi incluído um parágrafo único ao artigo 499 do Código de Processo Civil.

A nova redação do artigo 499 do CPC estabelece que a obrigação apenas será convertida em perdas e danos se o autor assim solicitar ou se for impossível a obtenção da tutela específica ou de um resultado equivalente. Essa alteração entrou em vigor com a publicação oficial da Lei 14.833 no Diário Oficial da União, em 28 de março.

A tutela específica consiste em obter a própria conduta do demandado, de acordo com o que está previsto em lei ou contrato. Já o resultado prático equivalente refere-se à obtenção do mesmo resultado, porém através da atuação de terceiros. Essa distinção é relevante porque afeta os meios executivos que podem ser utilizados para obter o resultado pretendido pelo autor da ação.

A primazia da tutela específica é respaldada pelo artigo 5º, XXXV, da Constituição Federal, que estabelece que a jurisdição tem o objetivo de evitar violações aos direitos antes mesmo que a lesão ocorra. Dessa forma, é possível buscar medidas executivas para garantir a tutela específica ou um resultado equivalente. Em casos de ameaça de descumprimento do dever de fazer ou não fazer, a tutela preventiva também pode ser aplicada.

No entanto, a tutela específica ou preventiva cede em duas situações de acordo com o artigo 499 do CPC. A primeira é quando o autor solicita a conversão da obrigação em perdas e danos, o que é compreensível, tendo em vista que o credor pode ter suas próprias razões para não desejar o cumprimento tardio da obrigação pelo devedor. A segunda é quando a tutela específica ou o resultado prático equivalente são impossíveis de serem obtidos.

O parágrafo único do artigo 499 do CPC, acrescentado pela Lei 14.833, traz exceções a essas situações. Ele estabelece que nas hipóteses de responsabilidade contratual previstas nos artigos 441, 618 e 757 do Código Civil, bem como nos casos de responsabilidade subsidiária e solidária, caso seja solicitada a conversão da obrigação em perdas e danos, o juiz concederá primeiramente a oportunidade de cumprimento da tutela específica.

No entanto, algumas dúvidas interpretativas surgem a partir desse novo texto. Por exemplo, as exceções estabelecidas se aplicam também às relações de consumo? A princípio, parece que não, pois a lei geral posterior não revoga a lei especial anterior. Isso significa que o campo de aplicação desse parágrafo único do artigo 499 do CPC seria bastante limitado.

Outra dúvida é sobre a referência a hipóteses de responsabilidade subsidiária e solidária. Está se falando de outras situações ou apenas está se afirmando que as exceções mencionadas se aplicam também a casos de responsabilidade subsidiária e solidária? É possível interpretar que se trata das mesmas hipóteses mencionadas anteriormente no dispositivo, ou seja, nos artigos 441, 618 e 757 do Código Civil.

Além disso, por que as exceções foram estabelecidas apenas para esses casos específicos e não para todas as obrigações de dar e fazer? Essas questões geram dúvidas sobre a interpretação e aplicação do parágrafo único do artigo 499 do CPC.

Quanto à questão relacionada ao direito intertemporal, a nova lei entrou em vigor na data de sua publicação, em 28 de março de 2024. Porém, não foi especificado se ela se aplica também aos processos em andamento. Nesse caso, a doutrina do isolamento dos atos processuais poderia ser aplicada, mas é importante considerar que o autor da ação poderia ter escolhido uma estratégia diferente caso a regra estivesse vigente anteriormente.

Essas são algumas reflexões iniciais sobre as mudanças trazidas pelo parágrafo único do artigo 499 do CPC. O texto gera desafios e dúvidas interpretativas, e é importante submetê-lo à consideração de outros especialistas no assunto.