
Um casal foi sentenciado a pagar uma compensação financeira a uma criança por terem desistido de adotá-la após 19 meses de processo.
Abuso de direito: devolução de criança adotada gera indenização por danos morais
A devolução de uma criança adotada é considerada um ato de violência, pois o menor é rejeitado por mais uma família. Portanto, configura um abuso de direito por parte dos adotantes, que não podem simplesmente desistir da adoção quando lhes for conveniente. A devolução só é considerada normal quando ainda está no estágio inicial de convivência.
Recentemente, a 7ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo condenou um casal a pagar uma indenização por danos morais no valor de R$15 mil a um menor que ficou sob a guarda provisória do casal por um ano e sete meses antes da desistência.
O adolescente, atualmente com 15 anos, tinha 11 anos quando foi colocado sob a guarda provisória de uma auxiliar de enfermagem e um operário da construção civil.
Após 19 meses de convivência, o casal decidiu não prosseguir com a adoção. Eles alegaram que a criança não correspondia ao perfil desejado, citando seus problemas de saúde e comportamentais como motivo.
O Ministério Público de São Paulo acionou a Justiça e a Vara Única de Getulina (SP) determinou a indenização.
Em seu recurso ao TJ-SP, os adotantes argumentaram que o menor apresentou comportamento arredio e problemas na escola durante a convivência, além de ter atitudes inadequadas envolvendo a mulher e a filha do casal.
Eles também alegaram que a desistência tardia ocorreu devido à demora do processo, com a intervenção do Ministério Público, mas que eles manifestaram a vontade de interromper a adoção assim que possível.
O casal afirmou que não recebeu orientação adequada sobre as limitações da criança, alegando que não estavam preparados para recebê-la.
O juiz convocado Ademir Modesto de Souza, relator do caso no TJ-SP, constatou que os adotantes foram informados sobre as condições de saúde e aprendizado do menor desde o momento em que foram contatados sobre a adoção. Mesmo assim, eles expressaram interesse em continuar com o processo e inserir a criança em seu ambiente familiar.
O casal também demonstrou a intenção de oferecer cuidados, garantir o tratamento psiquiátrico, incluir o menor no plano de saúde da família e proporcionar um suporte maior de aprendizado.
Na visão do juiz, os adotantes não foram mal orientados em relação às circunstâncias de saúde do adolescente.
Laudos técnicos e relatórios iniciais indicaram uma convivência familiar positiva, com melhora no comportamento da criança. O relatório pedagógico da escola em que o menor estudava também atestou seu bom comportamento em sala de aula, apesar das dificuldades de aprendizado.
No entanto, após nove meses de convivência, o casal manifestou desinteresse em adotar formalmente a criança. Eles alegaram que o menor não se encaixava no perfil desejado, que era de uma criança entre três e nove anos, aceitando apenas doenças tratáveis.
Também mencionaram a necessidade de resolver uma questão relacionada à herança de sua filha biológica e aguardar a conclusão de uma avaliação neurológica do garoto antes de tomar uma decisão final sobre a adoção.
O juiz afirmou que houve um ato voluntário por parte dos adotantes em postergar a desistência, prejudicando o adolescente. Além disso, os réus não apresentaram nenhum relatório médico com diagnóstico de retardo mental, mesmo mencionando frustração com esse diagnóstico.
Ademir Modesto de Souza também constatou negligência do casal ao interromper o acompanhamento multiprofissional e a medicação do menor, o que pode ter contribuído para a piora de sua saúde e comportamento, dos quais eles tinham pleno conhecimento.
Um laudo multiprofissional realizado ao fim da convivência também apontou que o casal culpava o menor por sua própria deficiência, o que é extremamente prejudicial para o desenvolvimento dele.
Portanto, a devolução de uma criança adotada sem motivo justificado configura um abuso de direito por parte dos adotantes. Nesse caso, o Tribunal de Justiça de São Paulo determinou que o casal pague uma indenização por danos morais ao menor.