
A consideração da presunção de inocência como um fator restritivo para a influência dos comportamentos.
O desafio público de moldar comportamentos para privilegiar interesses coletivos tem encontrado um importante aliado mais recentemente: os “nudges”. Um nudge, traduzido literalmente como “empurrão”, é um estímulo que convence as pessoas a adotarem determinada postura, sem oferecer recompensas diretas ou punições imediatas.
Richard Thaler, vencedor do Prêmio Nobel de Economia em 2017, e Cass Sustein, professor da Universidade de Harvard, conceituam o nudge como qualquer aspecto da arquitetura de escolhas capaz de previsivelmente mudar o comportamento das pessoas, sem vetar nenhuma opção e sem grandes mudanças em seus incentivos econômicos.
Algumas manifestações clássicas dessa estratégia são a presunção de intenção de doar órgãos em países como França, Hungria, Itália, Portugal, Espanha, Áustria e Bélgica, onde a negativa deve ser expressamente manifestada, e a disposição de alimentos saudáveis em escolas, para melhorar a qualidade da alimentação de crianças e adolescentes.
Outra forma de nudge é a criação de rankings, que incentivam uma competição saudável entre os participantes em busca de uma posição de destaque.
Por outro lado, a criação de “listas negras” também pode ser vista como um nudge comportamental, mas gerou discussões e críticas quanto ao princípio da presunção de inocência, consagrado na Constituição.
No caso das leis mato-grossenses 10.315/15 e 10.915/19, essas criam o Cadastro Estadual de Pedófilos e a veiculação de uma lista de pessoas condenadas por violência contra a mulher, respectivamente. Essas leis contemplam dados pessoais e fotos dos suspeitos, indiciados ou condenados, mas só serão divulgados os nomes e fotos dos agentes efetivamente condenados, aguardando eventual reabilitação. No entanto, a exigência de trânsito em julgado da decisão condenatória é necessária apenas para a lista de violência contra a mulher.
Uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI 6.620/MT) foi proposta pelo governador de Mato Grosso, alegando vício de iniciativa e competência privativa da União para instituir efeitos da condenação criminal. Além disso, a criação e manutenção dos cadastros estariam inseridas na esfera de competência do Chefe do Executivo.
O julgamento dessa ADI teve início em dezembro de 2023 e está marcado para conclusão em abril. Até o momento, votaram pela procedência parcial os ministros Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Luís Roberto Barroso, André Mendonça e Carmen Lúcia, reconhecendo a inconstitucionalidade da expressão “suspeito, indiciado ou” na Lei nº 10.315/2015, limitando a inserção no cadastro apenas aos efetivamente condenados com trânsito em julgado.
Os ministros Gilmar Mendes, Edson Fachin, Cristiano Zanin, Luiz Fux e Nunes Marques acompanharam o relator com ressalvas, posicionando-se pela inconstitucionalidade dos termos “suspeito, indiciado ou”, assim como da divulgação das informações sobre o grau de parentesco/relação entre agressor e vítima, circunstâncias do crime e idade da vítima no cadastro.
Essas iniciativas normativas ilustram uma tendência de modulação comportamental pelo Estado, com potencial impacto positivo, mas que encontra limites nos princípios e valores fundamentais do ordenamento jurídico.
Portanto, é importante considerar essas estratégias de nudge como ferramentas valiosas para melhorar a qualidade da ação pública, desde que respeitando os direitos e princípios constitucionais.