Opinião – Tamanho da Justiça do Trabalho deve ser discutido, diz ministro Gilmar Mendes

O ministro Gilmar Mendes, decano do Supremo Tribunal Federal, concedeu uma entrevista à ConJur e afirmou que nos próximos dez anos será necessário discutir o tamanho da Justiça do Trabalho, levando em conta a possibilidade de parte das ações que discutem as novas relações de trabalho passarem a ser de atribuição da Justiça comum. Gilmar Mendes acredita que essa Justiça pode estar superdimensionada e exemplifica com o caso do acidente de trabalho, que seria de competência da Justiça do Trabalho, mas ficou a cargo da Justiça comum.

Essa declaração ocorre em meio a uma crescente tensão entre o Supremo e o Tribunal Superior do Trabalho devido às decisões sobre o vínculo empregatício de motoristas e entregadores de aplicativos como Uber e iFood. Enquanto o Supremo entende que não há vínculo de emprego, a Justiça do Trabalho muitas vezes decide o contrário.

Na entrevista, Gilmar Mendes também menciona o alto número de ações em curso no país e ressalta que ainda há muitas reclamações sobre terceirização que chegam ao STF, mesmo que a corte já tenha pacificado a possibilidade de terceirizados atuarem em atividades-fim.

O ministro destaca que a grande pergunta no futuro será qual órgão judicial decidirá esses conflitos que surgirão não apenas das relações de emprego, mas das relações de trabalho em geral, como é o caso da “uberização”.

De acordo com o ministro, é importante considerar essas questões e discutir a real necessidade e eficiência da Justiça do Trabalho, especialmente diante das mudanças nas relações de trabalho e das demandas que surgem diariamente. Essa reflexão se faz necessária para garantir que os conflitos sejam resolvidos de forma adequada e que a justiça seja efetiva para todas as partes envolvidas.

Opinião sobre a Justiça do Trabalho

Como advogado há mais de 50 anos atuando na Justiça do Trabalho, gostaria de fazer algumas ponderações sobre a matéria apresentada. No caso do acidente de trabalho, a competência da Justiça Federal já está delimitada na Constituição, que especifica que ela deve processar e julgar essas causas.

Houve conflitos relevantes sobre a competência entre a Justiça do Trabalho e a Justiça comum, mas o Superior Tribunal de Justiça entendeu que não haveria questionamento sobre a relação de trabalho, mas sim uma ação indenizatória, o que determinou a competência da Justiça comum. Portanto, não houve uma perda de competência da Justiça do Trabalho, mas uma análise judicial da existência ou não da relação de trabalho, que definiu a competência.

No caso dos motoristas e entregadores de aplicativos, são questões novas, com formas de trabalho diferentes das tradicionais. A Justiça do Trabalho busca proteger esses trabalhadores, mesmo que de forma diferenciada dos empregados convencionais. Por outro lado, o STF entende que não há vínculo empregatício caracterizado nessas situações, destacando a falta de regulamentação legislativa nesses casos.

Em relação à terceirização, as decisões do Supremo já validaram essa prática, inclusive na atividade-fim. No entanto, muitos magistrados trabalhistas ainda mantêm entendimentos contrários a essa prática, o que gera um número significativo de reclamações ao STF. É necessário que o Supremo aprofunde a análise dessas reclamações, especialmente nos casos de contratações fraudulentas.

Existem situações em que grandes empresas criam terceirizadas sem as qualificações necessárias para proteger os direitos dos empregados, configurando uma fraude. Nesses casos, é preciso analisar a realidade dos processos e responsabilizar a empresa que contratou de forma fraudulenta, independentemente do trabalhador se considerar terceirizado. O STF não pode deixar de levar em conta a realidade e tomar decisões apenas com base na forma contratual.

É importante mencionar que a Justiça do Trabalho conta com inúmeros processos, mas também com um grande número de acordos feitos por meio de conciliações. Essa Justiça arrecada uma quantia considerável em custas, contribuindo também para a Previdência Social. Porém, é válido lembrar que a maioria dos processos decorre da inadimplência dos empregadores, que não cumprem corretamente os direitos dos trabalhadores.

Por fim, a Constituição de 1988 ampliou a competência da Justiça do Trabalho para abranger todas as relações de trabalho, não apenas as de emprego. No entanto, é preciso garantir que essa competência esteja sendo vista de forma adequada pelos órgãos competentes.

Em resumo, é necessário refletir sobre o tamanho e a eficiência da Justiça do Trabalho diante das mudanças nas relações de trabalho. É fundamental garantir que os conflitos sejam resolvidos de maneira adequada e que todos os envolvidos tenham acesso à justiça de forma efetiva.