Escritos de Mulher

As recentes notícias de que duas mulheres teriam sido vítimas de estupro coletivo em uma mesma casa noturna na Lapa, no Rio de Janeiro, chamam a atenção para a urgência do combate à cultura do estupro por meio de políticas públicas que efetivem os direitos das mulheres e garantam a segurança delas em espaços noturnos de lazer.

É alarmante constatar que casos de violência praticada contra mulheres em casas noturnas na Europa por jogadores de futebol brasileiros apenas reforçam essa cultura patriarcal que vulnerabiliza as mulheres e as coloca como alvo de crimes sexuais.

Infelizmente, diariamente mulheres e meninas são vítimas de crimes graves como estupro, assédio e importunação sexual. No Rio de Janeiro, em 2022, foram registradas 7.363 ocorrências de violência sexual, sendo que 1.881 mulheres denunciaram esse tipo de crime. No entanto, é importante ressaltar que esses números representam apenas os casos registrados, enquanto muitos outros não chegam ao conhecimento das autoridades. Estima-se que apenas entre 10% e 20% das vítimas conseguem fazer uma denúncia.

Diversos motivos contribuem para a falta de registro desses casos, como o medo das vítimas de serem desacreditadas, revitimizadas e a própria cultura de autoculpabilização que acompanha esse tipo de crime, impedindo que muitas mulheres cheguem a uma delegacia.

É importante mencionar que também não são raros os casos de mulheres maltratadas pela polícia durante o relato do ocorrido, o que reforça a dupla violência sofrida pela vítima. Perguntas invasivas, como sobre a roupa que estavam usando ou se estavam sozinhas àquela hora da noite, colocam em dúvida a palavra da vítima.

A realidade é que a palavra das mulheres é injustamente colocada sob suspeição, o que leva muitas delas a demorarem a registrar o crime, devido ao pânico, vergonha e sofrimento causados pelas situações de violência sexual.

Segundo o Ipea, ocorrem cerca de 822 mil estupros no Brasil anualmente, ou quase dois a cada minuto. No entanto, apenas 8,5% e 4,2% desses casos chegam ao conhecimento das organizações do Estado através dos registros administrativos da polícia e da saúde.

Estupros coletivos representam 15,8% das notificações, quando mais de um homem estupra uma mesma mulher. Os bares e espaços noturnos de lazer representam um alto risco para as mulheres, como ocorreu nos recentes casos na Lapa.

É evidente que somente um esforço coletivo pode ajudar a superar essa triste realidade da cultura do estupro. Para isso, é necessário incentivar as denúncias e criar condições para que as mulheres se sintam seguras ao registrar o crime e responsabilizar seus agressores.

É fundamental contar com o comprometimento dos estabelecimentos noturnos, como bares, boates e casas noturnas, para fortalecer as denúncias feitas pelas mulheres. O Protocolo “Sem Consentimento é Violência”, inspirado na lei da Catalunha e presente na Lei Municipal 8.186/23, estabelece diretrizes para esses estabelecimentos acolherem e protegerem as mulheres vítimas de violência, além de treinar seu pessoal e entregar as imagens das câmeras para a polícia.

É necessário que as boates e casas noturnas estejam comprometidas com a segurança das mulheres e valorizem a palavra delas. Não se pode naturalizar esses crimes nem permitir que mulheres sejam vítimas de estupros coletivos em locais onde deveriam se sentir seguras.

Além disso, é crucial que as investigações policiais sejam eficazes para que as vítimas se sintam protegidas. A união das vítimas também aumenta a chance de responsabilização dos agressores.

Devemos prestar solidariedade às mulheres vítimas de estupros coletivos, que enfrentam riscos maiores e maior violência. O Protocolo “Sem Consentimento é Violência” orienta as mulheres a escolherem estabelecimentos seguros e estabelece a divulgação de informações sobre o apoio oferecido nesses locais.

“Mexeu com uma, mexeu com todas” não pode ser apenas uma frase de efeito, mas sim um compromisso de luta das mulheres para o fim da cultura do estupro e de todas as formas de violência contra a mulher.

Referências:

[1] Notícia não fornecida
[2] Dossiê Mulher do Instituto de Segurança Pública
[3] Ipea, 2023