
Como a forma de agir pode influenciar na alteração de uma norma escrita.
Desde antes da promulgação do Código Civil, em 2003, a doutrina e os tribunais brasileiros já entendiam que a dinâmica dos contratos pode mudar além do previsto por escrito. Se as partes se comportam de forma diferente do que foi acordado inicialmente e essa nova dinâmica se torna um hábito que representa as expectativas das partes, ela pode se tornar a nova regra. Essa mudança será considerada uma alteração contratual tácita e prevalecerá sobre o que está escrito no contrato.
Isso ocorre porque a essência de qualquer contrato é resolver problemas e, caso a solução que melhor se adapte a uma determinada situação não esteja prevista no contrato, as partes podem combinar uma nova dinâmica livremente.
Um exemplo prático é quando um contrato estabelece que os pagamentos de um aluguel devem ser feitos nos quintos dias úteis de cada mês, mas o locatário sempre paga no dia 10. Se o locador aceita essa dinâmica por meses sem questionar, depois de um certo tempo não será mais possível alegar violação do contrato na Justiça.
Isso ocorre porque o princípio da boa-fé objetiva, previsto no artigo 422 do Código Civil, proíbe o comportamento contraditório. Esse princípio reprime comportamentos contrários à postura adotada pelas partes durante a execução do contrato, que tenham gerado expectativas legítimas à outra parte, mesmo que não estejam escritas. Ou seja, o comportamento é contraditório quando a parte deixa de cumprir com a proposta inicial ou toma uma atitude que dá a entender que não a tomaria.
Situações como essa são comuns e o comportamento contraditório é cada vez mais rejeitado pelo Poder Judiciário, pois pode ser interpretado como uma tentativa de obter vantagem, alegar má fé ou enganar o juiz.
O comportamento contraditório é considerado uma conduta ilícita, uma vez que viola a confiança e as expectativas da outra parte, causando prejuízos e podendo levar até a indenização. Por outro lado, o comportamento coerente e a confiança são requisitos éticos imprescindíveis nas relações contratuais, pois todos os negócios jurídicos pressupõem a credibilidade das situações.
Portanto, é importante gerenciar os contratos cuidadosamente, desde sua elaboração até o término de sua validade. Eles devem ser redigidos de forma cautelosa para evitar a criação de dinâmicas diferentes das regras escritas, que possam abrir brechas para reclamações ou enfraquecer a força obrigatória dos contratos.
Também é necessário acompanhar a execução do contrato e certificar-se de que está sendo seguido o acordo escrito. Caso seja identificada a criação de uma nova dinâmica que não deve prevalecer, é recomendável voltar rapidamente às disposições escritas, caso ambas as partes concordem. Além disso, é aconselhável documentar por escrito qualquer desvio contratual, deixando claro que não se repetirá no futuro.
O direito valoriza a conduta e a postura das partes e pode desconsiderar disposições escritas se entender que não correspondem à realidade do negócio. Nesse sentido, prevalece o princípio da boa-fé objetiva, que valoriza a confiança das partes e os comportamentos adotados durante a execução dos contratos.