Escritos de Mulher

No Dia Internacional da Mulher, em 8 de março, a França fez história ao atribuir o status de garantia constitucional ao direito ao aborto. Essa ação inédita inseriu no artigo 34 da Constituição Francesa a determinação de que a lei irá estabelecer as condições sob as quais as mulheres terão a liberdade de recorrer à interrupção voluntária de gravidez.

Durante a solenidade, o presidente Emmanuel Macron expressou seu desejo de incentivar outros países da União Europeia a seguirem o mesmo caminho de proteção aos direitos das mulheres. Essa mensagem parece ser direcionada aos Estados Unidos, que revogaram em 2022 a decisão de 1973 no caso Roe vs Wade e passaram a permitir que os estados americanos criminalizem a prática do aborto.

É importante ressaltar que o direito ao aborto não é algo novo na França. Em 1975, o Parlamento aprovou a Lei Veil, que ampliou os casos em que o aborto era permitido, acrescentando a possibilidade de interrupção até a décima semana de gravidez por razões pessoais da mulher, como angústia ou motivos terapêuticos. Essa lei foi submetida ao Conselho Constitucional francês, que não encontrou nenhuma violação da Constituição.

Outros países europeus também tiveram debates legislativos sobre o aborto nas décadas de 1970 e 1980, avançando posteriormente na questão. Muitos países, incluindo o Canadá, Argentina, Colômbia, México e Cuba, reconhecem que o direito à vida do feto não é absoluto e deve ser equilibrado com os direitos das mulheres à liberdade, autonomia reprodutiva, privacidade e saúde.

No Brasil, a legalização do aborto está em discussão na ADPF 442, que já recebeu o voto favorável da ministra Rosa Weber pela descriminalização da interrupção voluntária da gravidez nas primeiras 12 semanas. No entanto, o julgamento foi suspenso por um pedido de vista do ministro Luís Roberto Barroso.

É importante separar os argumentos e compreender o que está em jogo nesse debate controverso sobre o aborto. No Brasil, ainda há mulheres e meninas que são proibidas de fazer o aborto legal, mesmo em casos de estupro. Essa posição é obscurantista e não está de acordo com a lei.

O cerne da questão é se o Brasil pode e deve descriminalizar o aborto e em quais circunstâncias. O direito à vida garantido constitucionalmente não é absoluto e pode ser equilibrado com outros direitos, como é feito em outros países.

A regulamentação do aborto, ao contrário do que se pensa, pode diminuir os casos. Quando as mulheres têm acesso a serviços de saúde seguros e legais, o número de abortos clandestinos diminui. Além disso, a regulamentação também está associada a políticas de prevenção da gravidez indesejada.

Criminalizar o aborto coloca a vida das mulheres em risco. É necessário que o Estado assuma a responsabilidade de prevenir a gravidez indesejada, por meio da distribuição de contraceptivos e da realização de cirurgias contraceptivas, sem impor obstáculos ou restrições.

O debate sobre o aborto precisa ser racional e livre de argumentos políticos e religiosos. É preciso garantir a proteção dos direitos das mulheres e a saúde pública, em vez de promover o obscurantismo e a criminalização.