O termo “golpe do baú” é usado de forma pejorativa para descrever relacionamentos em que há uma grande diferença de idade e recursos entre os parceiros, suspeitando que o interesse principal do parceiro mais jovem seja o benefício financeiro, em vez de um relacionamento genuíno e equilibrado.

No intuito de proteger os interesses patrimoniais das pessoas idosas, que são frequentemente alvos desses interesses suspeitos, a legislação restringiu a autonomia de vontade daqueles que contraem casamento ou união estável acima de 70 anos, estabelecendo a obrigatoriedade do regime de separação de bens [1].

Embora os idosos não sejam considerados incapacitados de exercerem seus próprios direitos [2], é correto dizer que sua autonomia de vontade foi limitada pelo Estado.

Em fevereiro, o Supremo Tribunal Federal examinou a constitucionalidade dessa interferência na vida patrimonial dos idosos no caso do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1.309.642 [3], e fixou a seguinte tese: “Nos casamentos e uniões estáveis envolvendo pessoa maior de 70 anos, o regime de separação de bens previsto no artigo 1.641, II, do Código Civil, pode ser afastado por expressa manifestação de vontade das partes mediante escritura pública”.

A decisão do tribunal se aplica apenas a casos futuros e não afeta processos em andamento que discutam herança ou divisão de bens.

Além disso, pessoas com mais de 70 anos, atualmente casadas ou em união estável, estão autorizadas a alterar o regime de bens por meio de decisão judicial e escritura pública, respectivamente, mas essa alteração terá efeito apenas para o futuro.

Essa decisão do STF envia uma mensagem poderosa ao reconhecer a autonomia da vontade e a liberdade individual, afirmando que cada pessoa, independentemente da idade, merece respeito e dignidade em suas relações patrimoniais.

Nesse contexto, o planejamento sucessório se destaca como um importante instrumento jurídico para prevenir disputas entre herdeiros e garantir que a vontade da pessoa seja respeitada na divisão de seu patrimônio.

Existem várias estratégias comuns para garantir a disposição privada do patrimônio, como a escolha de um regime de bens no casamento ou união estável, a criação de holdings, doações, contratação de previdências privadas, seguros de vida e fundos de investimento, e a elaboração de testamentos.

Portanto, é responsabilidade de cada indivíduo, como “senhor do próprio destino”, realizar um planejamento sucessório que reflita sua vontade e proteja seu patrimônio, garantindo o direito de seus herdeiros.

Em resumo, a decisão do STF não expôs os idosos a golpes, pelo contrário, reconheceu que é responsabilidade de cada pessoa, independentemente da idade, utilizar os instrumentos disponíveis para assegurar sua proteção patrimonial e garantir um planejamento sucessório que reflita suas escolhas.

[1] Código Civil, art. 1.641, II.
[2] Código Civil, art. 3º e 4º.
[3] Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário com Agravo. ARE 1309642 RG. Relator: ministro Luís Roberto Barroso. DJ: 09/02/2024. Disponível em: . Acesso em: 06 mar 2024.